Fonte: ESTADÃO
Além da punição recorde na história do órgão, relator propõe que companhias vendam ativos correspondentes a 24% do mercado do cimento
Eduardo Rodrigues e Laís Alegretti – O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA – A maioria do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) optou ontem por acompanhar o voto do conselheiro relator, Alessandro Octaviani, e condenar as empresas acusadas de fazer parte do cartel do cimento no Brasil a pagar uma multa que soma R$ 3,1 bilhões e a vender parte de seus ativos, o que somaria 24% de toda a capacidade do mercado desse setor no País.
A decisão, porém, não foi concluída porque o conselheiro Marcio Oliveira Junior pediu vista dos autos do processo e não há prazo previsto para que ele apresente sua decisão. Até lá, os três conselheiros que acompanharam o voto do relator, e inclusive ele, podem alterar suas posições e mudar o entendimento do órgão. Se aprovada, a multa será a maior já aplicada pelo Cade em sua história.
A sessão de ontem durou mais de 13 horas. Segundo Octaviani, de cada R$ 100 que os brasileiros gastaram na compra de cimento nas últimas décadas, pelo menos R$ 20 foram cobrados de forma ilegal. “O cartel de cimento e concreto subjugou a sociedade brasileira durante décadas.” Os efeitos de um cartel, que é a lesão mais grave à concorrência, são de aumento dos preços para o consumidor e de restrição da oferta do produto.
O superfaturamento do cimento e do concreto no País teria causado prejuízos de mais de R$ 2 bilhões ao programa Minha Casa Minha Vida, segundo o relator, suficientes para construção de mais 50 mil moradias.
O grau de articulação das empresas torna a estimativa de prejuízos subestimada, na avaliação de Octaviani. Ele usou uma projeção internacional de margem de lucro obtida em práticas semelhantes em outros países e concluiu que o cartel teria um superfaturamento de mais de R$ 1,4 bilhão no faturamento apenas em 2005 – em uma década, seriam R$ 14 bilhões, segundo ele.
Octaviani declarou ter encontrado provas suficientes para caracterizar a prática de cartel. Em documentos apreendidos nas sedes da empresas e com as associações do setor, foram identificadas práticas de fixação de preço e de quantidade produzida, divisão regional de mercado e de clientes, criação de barreiras artificiais a entrada de novos concorrentes e criação de barreiras a importação de cimento.
Multas. A maior multa proposta pelo relator foi de R$ 1,565 bi para a Votorantim. A segunda maior foi para a Holcim, que recebeu uma multa dobrada (de R$ 508,593 milhões) por ser reincidente, já que foi condenada no chamado cartel da brita. (Veja os outros valores ao lado).
Para as entidades de classe do setor envolvidas no esquema, a multa soma R$ 5,3 milhões. Estão citadas no relatório a Associação Brasileira de Cimentos Portland (ABCP), a Associação Brasileira das Empresas de Serviço de Concretagem (Abesc) e o Sindicato Nacional da Indústria do Cimento.
As penas foram dadas pelo tamanho dos danos causados à economia e pela descaracterização da boa fé. “Os envolvidos na infração tinham consciência de sua conduta”, disse Octaviani.
Outra penalidade para as empresas acusadas de formar o cartel do cimento é a venda de parte de seus ativos, que, somados, representam 24% do mercado. A Votorantim terá de se desfazer de 35% da sua capacidade instalada. A venda deverá ocorrer para um só comprador, de forma que possa existir mais um grande integrante nesse mercado. A Intercement e a Cimpor, que fazem parte do mesmo grupo (Camargo Corrêa), devem vender 25% da sua capacidade instalada.
Antes do início do julgamento, o Cade julgou improcedente o pedido de assinatura de um acordo – protocolado pela Intercement Brasil, do Grupo Camargo Corrêa, que poderia livrar a companhia da acusação.
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