Fonte: Brasil Econômico
É incontestável o aumento do patamar de consciência ambiental no mundo, de modo que práticas econômicas realizadas até poucas décadas hoje estão despidas de legitimidade.
Penso em Cubatão que até trinta anos atrás era denominado o “Vale da Morte” pelos impactos da poluição sobre a saúde da população que ali vivia.
Naquela ocasião, notei, como advogado da Associação das Vítimas da Poluição e das Más Condições de Vida de Cubatão, que existiam barreiras legais no que tange à possibilidade de se buscar a defesa dos direitos no Poder Judiciário.
O Brasil avançou muito no reconhecimento dos direitos do meio ambiente, do consumidor, do patrimônio histórico, em grande parte pela acolhida que os mesmos tiveram na Constituição de 1988.
Um dos temas importantes abrigados pela Constituição diz respeito ao reconhecimento das cavidades naturais subterrâneas como bens da União, de modo que a Assembleia Nacional Constituinte reconheceu a importância deste grande patrimônio brasileiro: as cavernas sempre exerceram papel fundamental para a humanidade, pois lá nossos antepassados se protegiam das intempéries e registraram as primeiras manifestações escritas de que se tem notícia.
Por isso, desde 1937 o Brasil reconhece o patrimônio histórico e artístico, por iniciativa de Mário de Andrade.
Desde 1990, tramita um Projeto de Lei de minha autoria, no Congresso Nacional, com o objetivo de proteger o patrimônio espeleológico brasileiro. Ele foi apresentado na Câmara dos Deputados e aprovado.
Remetido ao Senado, foi apresentado substitutivo pela Senadora Marina Silva, que hoje está sob apreciação do Plenário da Câmara, ou seja, após uma tramitação de 21 anos, a matéria encontra-se apta a ser aprovada ou rejeitada.
Entretanto, dada a pressão das grandes empresas mineradoras junto à Casa Civil, a matéria encontra-se suspensa no Legislativo, regulada por um Decreto do Executivo e uma Instrução Normativa do Ministério do Meio Ambiente que simplesmente avocaram o poder de decisão sobre este importante patrimônio das presentes e futuras gerações de brasileiros.
Mais recentemente, o Conama permitiu, na Resolução nº 428 de dezembro de 2010, que a decisão final sobre a conservação e destruição das cavernas seja da responsabilidade dos órgãos estaduais, responsáveis pelos licenciamentos das atividades minerarias. Será esse o desenvolvimento sustentável tão falado?
O Brasil está adormecido no que tange à dilapidação deste patrimônio, que não se restringe a aspectos de natureza cultural. Contempla também uma enorme biodiversidade subterrânea.
De acordo com a professora Eleonora Trajano (USP), existe um campo denominado biologia subterrânea, absolutamente vital para entender a evolução da nossa fauna subterrânea e cujo conhecimento depende da proteção das cavernas brasileiras.
Recente matéria do Estadão mostrou que a ameaça é concreta e que cabe à sociedade observar o que determina a Constituição de 1988 que, além de proteger o patrimônio espeleológico, condiciona as atividades econômicas ao respeito ao meio ambiente.
Se, efetivamente, o Brasil leva a sério o desenvolvimento sustentável, deve cumprir sua Constituição e não abrir mão de seu grande patrimônio espeleológico em nome de uma exploração mineraria de curto prazo. Com a palavra, o Presidente da Câmara, a Presidente Dilma e as empresas de mineração que se dizem sustentáveis…
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Fabio Feldmann é consultor em sustentabilidade
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