Fonte: Público (Portugal)
Na viagem de Júlio Verne, o centro da Terra tem dinossauros e plantas exuberantes. É maravilhoso mas é ficção, ao contrário dos pequenos invertebrados que Sofia Reboleira descobriu na gruta mais funda do mundo, que, contra todas as expectativas, tem uma comunidade de espécies a uma profundidades sem precedentes. A expedição descobriu cinco espécies novas, algumas delas a viverem a mais de 2000 metros de profundidade, revela um artigo na edição deste mês da revista International Journal of Speleology.
A entrada da gruta de Krubera-Vorónia fica a 2240 metros de altitude e a 15 quilómetros do mar Negro, na Abkházia, república independente de facto da Geórgia. No Verão de 2010, Sofia Reboleira participou numa expedição organizada pela CAVEX, a equipa ibero-russa de espeleólogos que em 2007 tinha atingido a parte mais profunda da gruta, a 2191 metros. A bióloga está a fazer o doutoramento nas universidades de Aveiro e de La Laguna, em Espanha, e é especialista em insectos cavernícolas. Em Krubera, Sofia Reboleira ficou responsável pela inventariação da vida com o cientista espanhol Alberto Sendra, co-autor do artigo.
“Toda a actividade era dedicada à exploração espeleológica e investigação geológica. Não se conhecia absolutamente nada a nível biológico”, diz a bióloga. A partir de uma certa profundidade, a escuridão na gruta é absoluta, não há vegetação e a vida torna-se limitada. “O que pensávamos é que só havia vida nas primeiras partes”, explica Sofia Reboleira. Mas estavam enganados.
Como é que se procura vida na gruta? A maioria das galerias era vertical, por isso Sofia Reboleira ficou várias vezes suspensa por uma corda, à cata de bichos até aos 1400 metros de profundidade. A partir dos 1600 metros a gruta está submersa.
“O mais difícil foi o frio. Os animais são pequenos e de tamanho muito reduzido e precisamos de tempo para os procurar”, explica-nos. Para se aquecerem durante descidas que podiam durar dois dias, tomavam chá quente com água da gruta fervida, que está constantemente a escorrer e forma cataratas nalgumas regiões.
A equipa encontrou 16 espécies de invertebrados, pelo menos cinco são novas para a ciência. “Ficámos muito surpreendidos”, conta a cientista. Estas espécies estão distribuídas ao longo da gruta, dos 60 até aos 2140 metros. Há um pseudoescorpião – o predador de topo da gruta, parente do escorpião -, há um escaravelho, uma aranha, dois crustáceos que vão a nadar até aos 2140 metros, e outras três espécies que vivem abaixo dos 2000 metros, e que foram recolhidas por mergulhadores. Até agora, a espécie cavernícola conhecida a maior profundidade estava a 1980 metros.
Não se sabe como funciona a cadeia alimentar da comunidade. “Poderá ser suportada pela matéria orgânica transportada pela água”, especula Sofia Reboleira. Em 2013, a bióloga voltará à gruta. A inventariação vai continuar, mas não é tudo: “Vamos tentar perceber o significado de estes animais estarem ali.”
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