Morcegos ajudam na regeneração da Mata Atlântica

Fonte: Fundação Boticário

Comemorado em 27 de maio, o Dia da Mata Atlântica acende novamente a preocupação com esse bioma, que é o mais ameaçado do país, restando apenas 7% de sua cobertura original. Dados preliminares de uma pesquisa apontam que os morcegos frugívoros, que se alimentam exclusivamente de frutos, têm papel fundamental na regeneração da Mata Atlântica: eles semeiam as áreas degradadas com espécies nativas, contribuindo para a regeneração dessa floresta, que abriga cerca de 20 mil espécies de vegetais.

Dentre as 19 espécies registradas durante a pesquisa na Reserva Natural Salto Morato, algumas são insetívoras: Myotis ruber (foto)  Crédito: Marcelo Rubio

Dentre as 19 espécies registradas durante a pesquisa na Reserva Natural Salto Morato, algumas são insetívoras: Myotis ruber (foto)
Crédito: Marcelo Rubio

A pesquisa é realizada desde 2011 e procura entender o comportamento dos morcegos, suas rotas de voo, alimentação e padrão de dispersão de sementes, para poder avaliar seu papel na regeneração das florestas. A Reserva Natural Salto Morato, mantida pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, foi considerada o cenário ideal os desenvolvimento do estudo: ela está localizada em Guaraqueçaba, no litoral norte do Paraná, região que abrange parte do maior remanescente contínuo de Mata Atlântica no Brasil.

Até o momento, foram capturados 345 morcegos, de 19 espécies, das quais 11 são frugívoras. Do total de espécies, três foram registradas pela primeira vez na Reserva Natural Salto Morato: Eptesicus diminutus (insetívoro), Lampronycteris brachyotis (que se alimenta de insetos, néctar e frutos) e Micronycteris megalotis (insetívoro).

“Reflorestadores naturais”

O morcego frugívoro desempenha um importante serviço ambiental para a regeneração e a manutenção da cobertura vegetal dos ecossistemas onde vive. Alimentando-se de pequenos frutos e infrutescências, seus hábitos fazem dele um verdadeiro “reflorestador natural”: ele dispersa as sementes dos frutos que ingere por meio de suas fezes.

Esse serviço ambiental ganha amplitude em virtude das grandes distâncias que um morcego percorre a cada noite, visitando diferentes habitats. A dispersão do morcego frugívoro também ganha em rapidez: o processo digestivo é rápido, sendo que em algumas espécies uma semente pode levar apenas 30 minutos para percorrer todo o trato digestivo do animal e ser liberada novamente no ambiente.

Além da evidente importância ambiental, o papel de dispersão dos morcegos frugívoros contribui para a vida de milhares de pessoas e para a economia do país: a Mata Atlântica, que serve de habitat para diversas espécies desses animais, tem importância vital para cerca de 120 milhões de brasileiros que vivem em seu domínio, onde  são gerados aproximadamente 70% do PIB do país.

Ágeis e de hábitos noturnos, os únicos mamíferos voadores podem ser capturados facilmente por meio de redes localizadas em pontos estratégicos. Foi esta técnica que o pesquisador responsável pelo projeto, Marcelo Guimarães Rubio, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), utilizou, conseguindo se aproximar dos animais e capturá-los para estudo.

Os animais foram capturados em cinco fases de campo realizadas em 36 sítios amostrais, sendo que esses pontos estavam localizados em ambientes com diferentes tipos de vegetação: áreas ocupadas por gramíneas que estão sendo manejadas, áreas em estágios iniciais/intermediários de sucessão e áreas em estágios mais avançados de sucessão. Cada sítio amostral consistia em um local onde uma rede era armada a partir do solo. As redes permaneciam abertas a partir do pôr do sol por seis horas seguidas. Periodicamente, elas eram vistoriadas para se verificar a captura de morcegos. Os morcegos capturados eram acondicionados em sacos de algodão, triados, mensurados, identificados, anilhados, tinham amostras de suas fezes coletadas e depois eram novamente liberados.

As fezes foram coletadas para avaliar a dieta desses animais e o estudo constatou que a maioria deles é frugívoro, ou seja, alimenta-se de frutos. Um dos itens alimentares verificados são infrutescências de plantas do gênero Piper, que são mais comuns em áreas com estágios mais iniciais de recuperação. “Avaliamos que os morcegos dispersam, por meio das suas fezes, as sementes dos frutos, tendo papel fundamental nas áreas que estão em processo de regeneração”, explica Rubio.

Segundo o pesquisador, também foram traçadas relações entre a captura de morcegos frugívoros com a abundância de alimento e vegetação, assim como variáveis climáticas. “Verificou-se que nos sítios com maior abundância de Piper, houve maior captura deCarollia perspicillata e Sturnira lilium, espécies que consomem muito esses frutos e foram as mais abundantes durante o estudo”, explica. Ele aponta que também se tentou verificar a relação entre a variação da temperatura e precipitação (chuva) ao longo da noite com a captura de morcegos, porém essa relação não foi tão forte quanto a abundância de frutos.

Diversidade de Espécies

No Paraná, há registro de 66 espécies de morcegos. A equipe registrou na Reserva Natural Salto Morato a ocorrência de 28% dessas espécies. “Também é de se ressaltar que na reserva há a ocorrência de quatro registros importantes para o litoral paranaense:Dermanura cinerea, Lampronycteris brachyotis, Thyroptera tricolor e Trachops cirrhosus”, comenta o pesquisador.

Na lista brasileira de fauna ameaçada, constam cinco espécies de morcegos na categoria de ameaça vulnerável. Das cinco, duas são registradas na Reserva Natural Salto Morato:Myotis ruber e Platyrrhinus recifinus. “Com base nessas informações, e na alta riqueza de espécies, observa-se a importância da Reserva para a conservação de morcegos”, conclui.

Apoio à pesquisa

Mais de 90 pesquisas já foram realizadas na Reserva Natural Salto Morato, sendo que três delas contaram com a participação de Marcelo Rubio. Além da rica biodiversidade, o local tem um centro de pesquisas com alojamento e laboratório para oferecer suporte aos pesquisadores.

“A Reserva possui uma das melhores estruturas para pesquisa de campo que já conheci”, afirma Rubio. Segundo ele, outros fatores que o motivaram a realizar seu estudo atual nessa unidade de conservação foram a alta riqueza de espécies e a abundância de capturas de morcegos, bem como a facilidade de acesso para a montagem das armadilhas, pois há muitas trilhas em bom estado de conservação. Ele também destaca o financiamento da Fundação Grupo Boticário à sua pesquisa como um fator essencial para que ela pudesse ser realizada.

Os interessados em realizar trabalhos na Reserva podem obter informações clicando aqui.

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