Eu, Carlos Eduardo Martins, junto com Daisy Cirino de Oliveira, Ericson Cernawsky Igual e Maurício Alcântara Marinho formamos uma equipe para topografar as grutas Chapéu Mirim I e II, situadas no Núcleo Caboclos do PETAR (Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira) – SP.
A topografia parecia simples e, em alguns minutos, completamos o duto ativo, sempre seguindo o leito do riachinho que atravessa o maciço calcário de uma ponta à outra. Em paralelo e em um nível poucos centímetros acima do duto principal havia outro bem mais estreitinho que aumentaria o mapa da caverna em alguns metros.
A interligação entre esse conduto e o principal é feita por diversos ramais transversais de alguns centímetros de diâmetro. Um desses apenas (!) é que permitia a passagem sofrida de um corpo humano…
Passaram os rapazes e a moça ficou ali próximo, sobre um patamar para anotar as medidas, monitorar o tempo e o nível do rio que também adentrava a caverna próximo dali.

Mapa da Gruta Chapéu Mirim II
O condutinho é muito bonito, praticamente cilíndrico e “brilhoso” (!!)… parece que foi lapidado (!!!). O piso é recoberto de seixos rolados bem polidos (!!!!)… mal se podia ficar sentado (!!!!!), muito menos manobrar o corpinho avantajado dos três rapazes (!!!!!!).
Alguns metros nos acotovelando e empurrando o corpo com as pontas dos pés, como se estivéssemos sob as ordens de Capitão Nascimento, seguíamos, apressados, mapeando, até que, de repente, ouve-se um alerta agudo em um dos ramais estreitos:
– Acho que “tá chov…” O rio “tá” enchendo!!!!
A nossa calma deu lugar à pressa em retornar ao ramalzinho de entrada… Alguém levou uma bronca enquanto tentava organizar o equipamento dentro da mochila, em vez de correr.
Ao chegar próximo à nossa esperada saída, topamos com a enxurrada. A água também havia escolhido o nosso caminho para inundar o pequeno recinto. A imagem da água cristalina, que antes serpenteava tranquila a caverna, agora era a de um emaranhado de barro, galhos secos e folhagem se deslocando barulhenta e rápida.
Alguns segundos de espanto e demos meia volta arrastando nosso corpo pelo conduto já parcialmente inundado. Sem saber exatamente o que fazer, a tensão já era visível. Olhar para o alto em busca de uma fuga seria nossa única alternativa já que a água barrenta já adentrava pelas barras dos macacões, congelando até o nosso espírito…
Daisy Oliveira já não nos ouvia e mesmo assim chamou por nós até que os ramais foram completamente inundados, aumentando sua apreensão…
Alguns metros à frente e com a água praticamente inundando nosso pequeno conduto, Maurício Alcântara Marinho se espremeu por uma fenda e atirou-se para fora do calcário por uma clarabóia salvadora… Virou-se e nos arrancou do buraco pela gola.
Fora da caverna e aliviados entreolhamos nossos rostos pálidos e sujos.
Daisy Oliveira ainda nos aguardava dentro da gruta quando nos juntamos a ela para descrever nossa fuga.
Aliviados, demos por encerrados os trabalhos naquele dia, certos de que em espeleologia até as diminutas cavernas podem nos ensinar valiosas lições para a vida.
Relato narrado por Carlos Eduardo Martins (Caê).
PS: as lições a que me refiro estão ressaltadas na narrativa. Cada ponto de exclamação acrescido entre os parênteses demonstra as evidências que precisam ser consideradas na exploração e mapeamento espeleológico de cavernas ativas ainda que suas dimensões pareçam não impor respeito.
As cavernas Chapéu Mirim I e II compõem um conjunto atravessado por um riacho afluente do Córrego do Chapéu. Cada uma delas foi escavada em morrotes cársticos com algumas dezenas de metros de distância um do outro e formam um cenário de carstificação bastante didático.

Mapa da Gruta Chapéu Mirim I
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