Juiz determina a suspensão da criação do Parque Natural Municipal do Lageado em Iporanga – SP: Área concentra importante patrimônio espeleológico

Fonte: Iporanga na NET

Para os Ilustres Defensores o ato administrativo que determina a expropriação da área para que , posteriormente, seja criada uma Unidade de Conservação, é ilegal e abusivo, ou seja, está fora do que determina a lei e está eivado de arbitrariedade.
Nos últimos dias  deste mês os Defensores Públicos Andrew Toshio Hayama e Thiago de Luna Cury da Defensoria Pública do Estado de São Paulo- Unidade de Registro/SP impetraram, perante o Juízo da Comarca de Eldorado/SP um MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR com a única finalidade de suspender o Decreto Municipal nº 663/2012,  que declara de utilidade pública área de 5.255,57 há, de 06 de fevereiro de 2012, por ser  ato ilegal e abusivo, sob pena de crime de desobediência (artigo 26 da Lei 12016/2009) .
Com mais de 90 páginas de argumentação e cerca de 100 páginas de documentação, o Mandado de Segurança continha em seu teor toda a narrativa dos fatos ocorridos, desde a primeira reunião realizada na Praça Matriz de Iporanga com a população local e alguns afetados até a “consulta pública” realizada no dia 06 de fevereiro de 2012.
Para os Ilustres Defensores o ato administrativo que determina a expropriação da área para que , posteriormente, seja criada uma Unidade de Conservação, é ilegal e abusivo, ou seja, está fora do que determina a lei e está eivado de arbitrariedade.
“O Município omitiu a existência de comunidades quilombolas e tradicionais nos territórios afetados, inflamando a indignação dos movimentos sociais e da sociedade civil organizada. De fato, o Decreto original ameaçava trecho de remanescentes de quilombolas de Bombas e de Porto Velho.
Mais grave ainda, sequer ouviu as famílias ou os moradores arrolados no próprio Decreto de desapropriação, dando início a uma série de ilegalidades e arbitrariedades que violam direitos e violentam a dignidade da população.   (sic)”
Segundo consta no próprio mandado de segurança “Em resposta aos questionamentos formulados, a autoridade municipal coatora assim se manifestou (declarações gravadas em sistema audiovisual, que instrui o pedido), consoante transcrição literal:
Essa empresa, esse grupo de empresas, na verdade, isso daí, gente, não foi uma idéia da Prefeitura de Iporanga, tá? Isso é um grupo gestor, um conjunto de empresas, não é uma empresa só. Criaram esse módulo, esse modelo, e levaram para um grupo de deputados, para o Governador e para o Secretário do Meio Ambiente. Por que o Governador abraçou a idéia? Pelo fato de que, na verdade, as terras não são do Município, as terras serão compradas e doadas para o Município com o compromisso de transformar isso em Parque Municipal. Entendeu?”
Outro fato questionado na ação foi a atitude da então secretária do meio ambiente Janayna de Oliveira Franco, que desvendou em público várias irregularidades no órgão municipal.
Veja o vídeo no youtube: www.youtube.com/watch?v=hwIX4iwIAsA
Por fim, só restou dúvidas aos Defensores:
“Do que se pôde depreender da argumentação desenvolvida pelos representantes dos grupos econômicos, corroborada pelo próprio Prefeito em declaração registrada no dia 06 de fevereiro de 2012, o esquema funcionaria da seguinte forma: 1) os produtores, interessados no negócio, comprariam glebas/territórios no Lageado; 2) em seguida, doariam ao Município; 3) que se responsabilizaria, por sua vez, pela criação, na área doada, de Unidade de Conservação, consistente em Parque Natural Municipal, nos termos do Sistema Nacional de Unidades de Conservação; 4) com isso, os grupos econômicos promoveriam compensação ambiental, produzindo (ou seria destruindo?) em certas áreas (mais valorizadas) e, simultaneamente, preservando outras (menos valorizadas).
Neste quebra-cabeça, faltam algumas peças e outras definitivamente não se encaixam: 1) não explicaram qual o destino dos moradores afetados na região do Lageado (com a criação de Parque, nos termos do SNUC, não mais poderiam permanecer na área); 2) não esclareceram suficientemente o motivo pelo qual não se procedeu à negociação direta com os residentes no local; 3) o Decreto de desapropriação, a outro turno, parece completamente fora de lugar e de sentido.
Se o Município não terá ônus algum, se não irá despender “nenhum centavo” (como asseveraram insistentemente os representantes de misteriosos grupos econômicos), qual a razão para a existência do ato coator? Se o interesse realmente não era e nunca fora expropriar e indenizar moradores, o que motiva o decreto?
Por outro lado, se o negócio visa a satisfazer necessidades de interesses econômicos privados, qual a utilidade pública do ato coator?”
            Depois de todas as argumentações o Meritíssimo Juiz Raphael Garcia da Comarca de Eldorado deferiu a medida liminar para sustar os efeitos do decreto municipal nº. 663/2012 do município de Iporanga, suspendendo-o até que haja decisão em contrário ou julgamento do mérito desta ação, não podendo tal ato normativo produzir qualquer efeito ou dele advir qualquer medida.
Em perguntas formuladas à Drª Dianna Mendes da Silva, advogada local, esta respondeu que a suspensão do ato faz com que a Prefeitura Municipal deva parar, imediatamente, com qualquer tipo de ato que implique na realização do Parque Natural Municipal de Iporanga. Explicou ainda que desta decisão cabe recurso no prazo legal.
Para quem quiser ter acesso ao conteúdo do processo é só acessar www.tjsp.jus.br, o número é: 172.01.2012.000861-3
 POR: Nilton F da Silva – Paulo Sérgio Furquim ( Textos) – 16/06/2012

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VEJA ABAIXO O DESPACHO NA INTEGRA:
Despacho Proferido
Vistos. Trata-se de mandado de segurança interposto por XXXX e outros, representados judicialmente pela DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO em face do PREFEITO MUNICIPAL DE IPORANGA, com pedido liminar pelas seguintes razões: Segundo a exordial, o decreto municipal 663/12, publicado no Diário Oficial em 06 de fevereiro de 2012 expropriou vasta área territorial para a criação de futuras unidades de conservação, consistentes em parques de proteção integral, sendo compulsória a expulsão dos residentes locais, visto que a natureza do parque seria incompatível com a presença de moradores. Ainda conforme a inicial, o referido decreto municipal declarava como de utilidade pública, para fins expropriatórios, uma área total de 5.255,57 Ha, visando a criação de parques naturais municipais. Entretanto, a área contemplada pelo decreto seria ocupada pelos impetrantes e outras pessoas, sendo possível que haja presença de remanescentes quilombolas, ainda que tais comunidades não sejam juridicamente constituídas. No mais, alegam os impetrantes que não houve prévia oitiva dos moradores locais ou estudos técnicos que embasariam a delimitação da área e a identificação da espécie de unidade de conservação a ser adotada. A lei 9985/2000 teria sido desrespeitada pelo decreto objeto da ação, com conseqüências nefastas aos moradores e residentes locais. Os impetrantes buscam a concessão de medida liminar, visando a suspensão do ato coator, e, por conseqüência, a suspensão do procedimento administrativo instaurado para discussão acerca da criação do Parque Nacional em Iporanga, que atingiria em cheio aos moradores do bairro Lageado, tendo em vista a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora. Com a inicial, juntou-se documentos. É O BREVE RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO Concedo a gratuidade da justiça, vez que os impetrantes encontram-se processualmente representados pela Defensoria Pública deste estado. Inicialmente, atento que é certo que o manejo de mandado de segurança contra ato normativo pressupõe cuidar-se de ato de efeitos concretos, sob pena de carência de interesse de agir, como bem sintetizado pela Súmula n° 266 do STF: “Não cabe mandado de segurança contra lei em tese”. Vale dizer, a tutela, mesmo preventiva, não prescinde da demonstração dos efeitos concretos que os impetrantes certamente teriam de suportar, em decorrência da edição da norma acoimada de vícios. No caso em apreço, inegável que o decreto municipal atacado é dotado de efeitos concretos, na medida em que desapropria extensa área territorial, em prejuízo a diversos moradores e residentes no local, razão pela qual o procedimento escolhido é pertinente e acertado. A liminar em mandado de segurança se sujeita aos mesmos requisitos que as demais liminares pleiteadas em outros procedimentos, quando requeridas initio litis, ou seja, para que a medida seja admitida devem concorrer a relevância do fundamento do pedido, o que se caracteriza pelo fumus boni iuris, e o perigo de um prejuízo, se do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida caso não seja deferida a segurança, o que nada mais é que o periculum in mora. A providência tem natureza processual e tem o único escopo de garantir o resultado útil do processo, ao final. Não cabe, em sede liminar, a análise do mérito da ação, mas apenas a presença dos dois requisitos supracitados. Com base na farta documentação juntada, inequívoco que o decreto atacado (fls. 242) apontou de forma uníssona que a área desapropriada seria utilizada e destinada à criação de Unidade de Conservação Municipal, conforme a lei 9.985/2000. Segundo o artigo 5º, incisos II e III da referida lei, o sistema nacional de unidades de conservação terá como base o efetivo acompanhamento da população residente no local, em prol da democracia participativa e visando a ampla e coletiva discussão sobre o assunto, exatamente, pois, entendeu o legislador que a criação destas unidades não poderia afrontar direitos e interesses dos maiores atingidos, tendo em vistas as inúmeras restrições legais incidentes sobre a área. Art. 5º. O SNUC será regido por diretrizes que: II – assegurem os mecanismos e procedimentos necessários ao envolvimento da sociedade no estabelecimento e na revisão da política nacional de unidades de conservação; III – assegurem a participação efetiva das populações locais na criação, implantação e gestão das unidades de conservação. (grifamos). Se não bastasse, o parágrafo segundo do artigo 22 do mesmo diploma legal é ainda mais cristalino ao impor ao Poder Público a realização de consulta popular prévia, sendo-lhe vedada à criação da unidade sem que todos os ditames legais sejam rigorosamente obedecidos. Art. 22. As unidades de conservação são criadas por ato do Poder Público. §2º. A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade, conforme se dispuser em regulamento. § 3º. No processo de consulta de que trata o § 2º, o Poder Público é obrigado a fornecer informações adequadas e inteligíveis à população local e a outras partes interessadas (grifamos). Toda a vasta documentação que acompanha a inicial, em especial a de fls. 248, demonstra que não houve prévia consulta popular. Pelo que se depreende, em sede de cognição sumária, o ente público municipal inverteu a ordem das medidas que deveriam ser tomadas. Antes de iniciar as tratativas e discussões pertinentes, expediu decreto de desapropriação, vinculando a área à criação de Parque de Unidade de Conservação. Assim agindo, já denota que as consultas públicas e discussões que buscará travar com a população interessada serão falaciosas e com desfecho já arquitetado. Ora, parece-me de clareza solar que a municipalidade, através de seu representante legal, já se decidiu pela criação do parque, sendo a consulta mera formalidade, sem qualquer objetivo razoável. Assim agindo, causa insofismável desvio no procedimento a ser adotado. Como bem salientado e exposto na peça inicial, o decreto de desapropriação, da maneira como feito, serve apenas como forma de coação e pressão sob os moradores locais, o que não se pode admitir. Ademais, também de forma bem exposta na inicial, não se olvida que não cabe ao Poder Judiciário imiscuir-se na discricionariedade administrativa. Ou seja, caso a administração pública entenda pela desapropriação da área, por utilidade pública, não se pode questionar tal atuação. Todavia, na celeuma posta, o ato de desapropriação já nasceu vinculado à criação da unidade de conservação, sem que os requisitos legais fossem preenchidos para tanto. O documento de fls. 248, convocando os interessados para a consulta pública, possui data posterior ao do decreto de fls. 246, o que, por si só, é suficiente à configuração do fumus boni iuris. Não cabe, neste momento, tentar elucidar os objetivos do ente público, sejam eles lícitos e morais ou não. Qualquer dissertação ou aprofundamento que se faça seria precipitado e temerário, visto que a autoridade coatora ainda não teve a oportunidade de se manifestar nos autos. Fato é que os documentos que instruem o feito indicam de forma robusta que os moradores do local não foram ouvidos ou consultados sobre a criação do Parque, o que enseja a possível nulidade do procedimento adotado pelo município de Iporanga, sendo de rigor a concessão da medida liminar para suspender os efeitos do decreto atacado. Quanto ao periculum in mora, insofismável que a perduração dos efeitos do decreto serviriam como forma de desviar o escopo das consultas públicas exigidas pelos textos legais acima mencionados. Como bem se sabe, a grande maioria dos moradores da região desapropriada possui parcos conhecimentos jurídicos e nível econômico e social longes do ideal, sobrevivendo, no mais das vezes, em conseqüência de pequena agricultura de subsistência desenvolvida no local. Neste cotejo, não se pode permitir que continuem a participar das discussões e consultas formalizadas para eventual criação do parque sob a pressão de prévio ato normativo que, desde logo, desapropria a área. Mister que lhes seja concedido o direito de analisar a questão e estudar as pretensões do ente municipal de forma livre e isenta de pressões ou qualquer forma de coação ou receio. Não se olvida que a criação do parque e da unidade de conservação não depende de aprovação dos moradores, requisito não previsto em lei. Contudo, até para que não haja utilização indevida do ato jurídico produzido em questões de natureza política, prudente que todo o procedimento previsto em lei seja devidamente realizado, ainda que não vincule o ato discricionário do administrador. Finalmente, atento que caso a liminar não seja concedida neste momento, poderá haver inutilidade do provimento final. Com a criação do parque, qualquer ato de desafetação ou redução de seus limites dependeria de lei específica, o que poderia sepultar todas as irresignações expostas na inicial. Desta feita, por entender que não houve consulta popular prévia e concretização da democracia participativa exigida pelo legislador, com a publicação de decreto de desapropriação anterior, em flagrante desvio do objetivo legal, não há alternativa senão a concessão da liminar. A concessão da liminar não análise o mérito da causa, visando apenas resguardar eventual solução final favorável aos impetrantes. No momento oportuno, após as informações da autoridade coatora, o feito será por completo analisado, em especial a prova pré-constituída juntada em sistema audiovisual. No mais, caso ao final haja denegação da ordem, não haverá qualquer prejuízo ao ente público, em especial em razão da celeridade prevista para este writ. Portanto, DEFIRO a medida liminar, como pleiteada pelos impetrantes, pois presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, para sustar os efeitos do decreto municipal nº. 663/2012 do município de Iporanga, suspendendo-o até que haja decisão em contrário ou julgamento do mérito desta ação, não podendo tal ato normativo produzir qualquer efeito ou dele advir qualquer medida. Deixo de impor multa diária, pois a suspensão independe de qualquer ato pela autoridade coatora, restando claro que qualquer ação originária do mencionado decreto será nula de pleno direito, enquanto perdure o efeito da suspensão. Deixo, também, de determinar a suspensão do procedimento administrativo que visa à criação do Parque Natural de Iporanga, porquanto a simples suspensão do decreto de desapropriação é suficiente a possibilitar a participação popular e as discussões por todos os interessados, incólumes de qualquer pressão ou coação e por entender, também, que a continuidade dos trabalhos, sem interrupção, ensejará a viabilidade de se amealhar mais informações e detalhes sobre as intenções do ente público e eventuais conseqüências a todos os atingidos. Notifique-se a autoridade cotaora, para que preste informações no prazo legal de 10 dias. Cite-se a Prefeitura Municipal de Iporanga, na pessoa de seu procurador judicial, acerca desta ação, nos termos do artigo 7º, II, da lei 12.016/09. Após o prazo, com ou sem manifestação, dê-se vista dos autos ao MP para parecer. Em seguida, conclusos para sentença. Int. Expeça-se o necessário.
Eldorado, 11 de Junho de 2012.
Raphael Garcia Pinto
JUIZ DE DIREITO
FONTE:  www.tjsp.jus.br, o número é: 172.01.2012.000861-3
Nota do GPME:
O Grupo Pierre Martin de Espeleologia mantém dois projetos de prospecção, exploração e documentação espeleológica nessa área (Sistema Pérolas – Santana / Sistema Córrego Fundo – Córrego Seco), paralisados após o embargo das cavernas em 2008, quando alguns proprietários passaram a proibir o acesso às cavernas, antes autorizado pela administração do PETAR. O grupo aguarda algum ato que permita o acesso oficial a essas áreas para a continuidade desses importantes projetos.

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